Coronavírus e o direito do trabalho

23 de março de 2020

Com a declaração de pandemia pela Organização Mundial de Saúde (OMS), a determinação de isolamento e fechamento de vários estabelecimentos, surgem diversas dúvidas acerca destas medidas de contenção e tratamento da doença, que trazem consequências para as relações de trabalho. Nesse post e em nossas páginas nas mídias sociais, tentaremos sintetizar boa parte de tudo que reunimos de informações e conhecimento jurídico sobre temas atinentes ao direito do trabalho e da previdência social.

Teletrabalho e “Home Office”

Uma das medidas mais comuns adotadas neste período foi a dispensa dos empregados de comparecer fisicamente ao posto de trabalho e permitir a realização de trabalho em domicílio. Na prática, o que ocorre é a alteração do local de trabalho, devidamente justificada por motivo de força maior, de modo que os demais aspectos do contrato de trabalho permanecem inalterados, ou seja, todos os direitos do trabalhador são mantidos, inclusive quanto à remuneração, jornada e períodos de descanso. Podem ser aplicados também aos contratos de estágio e de aprendizagem (“jovem aprendiz”).

O teletrabalho é o conjunto de atividades desempenhadas no domicílio do empregado ou em qualquer outro lugar, mas que poderiam estar sendo desempenhadas na empresa, não fossem as circunstâncias excepcionais – essa é a diferença fundamental para o trabalho externo, que é aquele que necessariamente só pode ser realizado fora do ambiente da empresa, por suas características.

Por força da Medida Provisória nº 927/2020, foi autorizado ao empregador, a seu critério, alterar o regime de trabalho presencial para o teletrabalho, o trabalho remoto ou outro tipo de trabalho a distância e determinar o retorno ao regime de trabalho presencial, independentemente da existência de acordos individuais ou coletivos, dispensado o registro prévio da alteração no contrato individual de trabalho.

Quarentena, isolamento e faltas justificadas

Em fevereiro de 2020 foi promulgada a Lei nº 13.979/2020, que dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do Covid-19, sendo que, de acordo com o previsto na legislação, é possível a adoção de medidas de isolamento e de quarentena para pessoas doentes, contaminadas ou com suspeita de contaminação

Em caso de isolamento (separação de pessoas doentes ou contaminadas) e de quarentenados (restrição de atividades ou separação de pessoas suspeitas de contaminação das pessoas que não estejam doentes), a ausência do empregado no trabalho será considerada falta justificada ao trabalho. Nesse caso, o empregado recebe a remuneração normalmente.

Lembramos que, no caso de trabalhador efetivamente infectado, os primeiros 15 (quinze) dias de afastamento são pagos pelo empregador, ao passo que, daí em diante, é o INSS quem paga a remuneração, através do auxílio-doença. Ultrapassados 30 dias de licença remunerada, o empregado perde o direito de férias.

Não se enquadrando nos casos justificados de quarentena e afastamento de infectados, o empregado que faltar ao trabalho sem a devida justificativa formal será considerado ausente sem motivo, produzirá o desconto dos dias de falta no salário, perda do repouso semanal remunerado e desconto nas próximas férias, além de, em caso de falta por mais de 30 (trinta) dias consecutivos, poder ser configurado o abandono de emprego e autorizada a demissão por justa causa.

Concessão de férias aos empregados

Outro meio para evitar a contaminação é a concessão de férias individuais ou coletivas aos trabalhadores.

No caso das férias individuais, o empregador deve comunicar o empregado com prazo de 48 (quarenta e oito) horas, por escrito, indicando o prazo de férias a serem gozadas. As férias não podem possuir período inferior a 5 (cinco) dias e poderão ser concedidas mesmo que o período aquisitivo (12 meses de trabalho) não tenha sido atingido. O pagamento do salário se mantém normalmente, mas o adicional de 1/3 relativo às férias pode ser postergado até a data do pagamento do 13º salário.

No caso de férias coletivas, caberia ao empregador a comunicação do Ministério da Economia e do sindicato da categoria profissional sobre as férias. Contudo, a Medida Provisória nº 927/2020 dispensou o empregador de cumprir essa formalidade.

Aproveitamento e antecipação de feriados

Durante o estado de calamidade pública, os empregadores podem antecipar o gozo de feriados não religiosos federais, estaduais, distritais e municipais e deverão notificar, por escrito ou por meio eletrônico, o conjunto de empregados beneficiados com antecedência de, no mínimo, quarenta e oito horas, mediante indicação expressa dos feriados aproveitados. Isso significa que feriados que seriam gozados no futuro, em algum momento do ano, podem ser antecipados para serem concedidos como “folga” agora.

Banco de horas

Empregador e empregado podem firmar acordo para compensação dos dias sem jornada de trabalho, a serem compensadas em até 18 (dezoito) meses – a Medida Provisória nº 927/2020 alterou disposições da CLT, que permitiam a compensação em no máximo 6 (seis) meses (acordo individual) ou 1 (um) ano (acordo com sindicato).

Proteção do meio ambiente laboral e afastamento do trabalhador com COVID-19

Para as profissões cujo trabalho a distância se mostre inviável, o cuidado e manutenção de meio ambiente laboral sadio é obrigação do empregador, que deverá orientar os empregados em boas práticas de higiene e saúde para evitar a disseminação da doença, bem como oferecer os meios adequados ao seu cumprimento.

Estas ordens devem ser de acordo com as orientações da OMS como: lavar as mãos com água e sabão, utilizar álcool gel, evitar contato com as mucosas, cobrir a boa e o nariz ao tossir ou espirrar, evitar aglomerações, dentre outras medidas informadas pelo Ministério da Saúde.

Caso o empregado descumpra as determinações, é possível a aplicação de sanções e, a depender da gravidade, podendo transmitir a doença aos demais empregados, incidir hipótese de justa causa. Ao mesmo tempo, cabe ao empregador oferece meio ambiente adequado como, exemplificativamente, disponibilizar local para lavar as mãos, sabão, álcool gel, rotação de empregados.

Caso haja suspeita de que qualquer dos empregados tenha contraído coronavírus ou tenha estado em contato com alguém contaminado, caberá à empresa afastar o empregado, nas mesmas hipóteses das demais licenças de saúde, mediante apresentação de atestado, pelo empregado.